São por demais conhecidas as críticas de Nuno Crato em
relação ao eduquês à pedagogia romântica, ideologias
responsáveis pelo descaminho por onde se enredou o ensino em Portugal nos
últimos 30 anos. Em Algumas ideias
dominantes na educação em Portugal (2010), o mais mediático matemático da
actualidade exibe as 3 ideias erradas que dominaram o ensino em Portugal, a
saber: que o estudo e a escola assentam na motivação; que o propósito do ensino
é a compreensão crítica das matérias; e que as vivências e o meio cultural dos
estudantes devem nortear o ensino. Já no seu livro de estreia em matéria de
educação, O ‘eduquês’ em discurso directo
(2006), verberava estes e outros preconceitos pedagógicos, mas ia mais
longe: apontava ideias e definia um caminho para aquilo “que se deve adoptar na
educação”. O rumo devia ser traçado sobre dois vectores: “o ensino não precisa de reformulações drásticas nem de reviravoltas
pedagógicas revolucionárias” e “é
preciso centrar forças nos aspectos essenciais do ensino, ou seja, na formação
de professores, no ensino das matérias básicas, na avaliação constante e na
valorização do conhecimento, da disciplina e do esforço”.
Se o actual ministro da educação vai conseguir
implementar, sem revoluções pedagógicas ou outras, algumas das suas ideias, eis
uma questão que no futuro se verificará. Para já, o ciclo económico recessivo
não lhe é favorável. Mas como ele próprio afirmou nos écrans de televisão: é preciso fazer mais e melhor com menos. Uma
coisa é certa: não se fazem omeletas sem ovos. Com menos dinheiro formar mais e
melhores professores e avaliar mais e melhor os docentes e os alunos, não é
tarefa fácil. O problema reside na capacidade de “centrar forças”, isto é,
congregar as energias de um sistema que se tem revelado entrópico. Também será
decisivo estabelecer, com critério, currículos essenciais, e definir, de modo
rigoroso e exigente, metas de aprendizagem. No que diz respeito “à valorização
do conhecimento, da disciplina e do esforço”, não me parece que isso esteja ao
alcance de qualquer equipa ministerial. Os valores de uma sociedade não se
impõem por decreto. Dependem das grandes narrativas que dão sentido ao mundo,
ou como afirma Neil Postman (O fim da
educação, 1995): “da existência de narrativas partilhadas e da capacidade de
tais narrativas nos darem uma razão inspirada para o ensino”. Todavia, a
narrativa educativa dominante, escorada no pressuposto sociológico da
desresponsabilização pessoal, é filha de um deus maior, o deus do consumismo, que
promete a felicidade imediata e desvaloriza o conhecimento, a disciplina e o esforço.
É capaz Nuno Crato afrontar esse deus maior, sem cair em desgraça? Tomara que
sim, pois como dizia a minha vizinha em conversa de ocasião: trata-se de um
ministro com boas ideias e ainda por cima simpático. Eu acredito em algumas
delas, como esta: “A escola ainda não
está a ser um garante da igualdade de oportunidades porque, em muitos casos, se
desiste dos alunos mais mal preparados e porque se tem tomado, em muitos casos,
a atitude de baixar os braços e não ser exigente, pensando que a exigência vai
prejudicar os pobres, quando no fundo é exactamente o contrário – vai dar mais
oportunidades aos pobres.” (Expresso, Única, 3/9/2011)
José M.