domingo, 15 de abril de 2012

Das palavras e das coisas


É costume associarmos a palavra fundamentalismo a formas de governo teocráticas e a países em que predomina uma visão conservadora das crenças religiosas, assim como à tendência para orientar os crentes no sentido de um regresso aos dogmas considerados como fundamentais ou originários. O fundamentalismo islâmico é, hoje por hoje, o exemplo que nos vem imediatamente à cabeça. No entanto, atitudes fundamentalistas não são exclusivas de assuntos religiosos nem de governos ditos autocráticos e iliberais. Mesmos em países de governos classificados como democráticos e liberais, como é o caso do governo português, os tiques fundamentalistas podem tornar-se evidentes. 
O primeiro deles é sem dúvida o fundamentalismo do mercado. Impera no governo a crença de que os mercados – e não a política – constituem a solução para todos os nossos males. O regresso aos mercados transformou-se na ideia de paraíso que nos salvará do inferno em que, por culpa própria, entretanto vivemos. Inevitavelmente, teremos de passar pelo purgatório de um programa de empobrecimento (in)voluntário – em curso - e, paralelamente, por um processo de emagrecimento do estado. Tudo isto à revelia da vontade popular. Apenas porque a Troika, a mando dos mercados, dixit. Depois disso, os mercados farão o seu trabalho. Virão charters de investidores estrangeiros, que produzirão tanta riqueza que sobejará dos seus bolsos e escorrerá até aos dos mais pobres.
Outro tique fundamentalista pode ser constatado nas últimas medidas que o ministro da saúde quer impor aos cidadãos que sofrem da doença do tabagismo. Trata-se simplesmente de proibir aos fumadores o seu vício, no espaço privado dos seus automóveis, quando acompanhados de crianças. O problema não está na possibilidade de fiscalizar ou não o interdito. Está, em primeiro lugar, no abuso do poder do estado face à liberdade do indivíduo; em segundo lugar, encontra-se na sobredeterminação do privado pelo público; por último, na imposição ao cidadão comum da ideia de bem, não o deixando escolher o que para si é uma “vida boa”. Tudo isto poderia ser compreensível, não se desse o caso de estarmos perante um governo que se diz liberal ao mesmo tempo que pretende legislar contra os princípios basilares do liberalismo.                    
O cerne do fundamentalismo assenta numa crença que, à força da sua repetição, tem pretensões de exclusividade à posse da verdade. Essa crença assume, no mundo ocidental e nos últimos trinta anos, uma feição económica. Oriunda das escolas económicas austríaca e de Chicago (cujos gurus foram Friedrich Hayek Milton Friedman) corre mundo, globaliza-se e faz doutrina. Ela exprime-me hoje na mais perigosa de todas as ideias, em termos políticos: não há alternativa!

José M

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Franklin Delano Roosevelt, I welcome their hatred.
Madison Square Garden, 1936


Na época da total falência da política, que as grandes figuras do passado nos possam inspirar.



João M